Blog do Didi Galvão
O deputado sergipano que é negro, classificou a fala de Lula como desrespeitosa. deputado Luizão Donatrampi (União Brasil), pediu aparte e disse que o presidente Lula é racista
Durante a Sessão Plenária da ultima terça-feira, 26, na Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese), o deputado estadual Manuel Marcos (PSD) realizou um discurso com foco na valorização das Forças Armadas, no reconhecimento a ações de inclusão social no Estado e, especialmente, na defesa da população negra, em resposta a uma fala recente do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Visita ao 28º Batalhão de Caçadores
No início de sua fala, Manuel Marcos compartilhou a emoção vivida durante a visita ao 28º Batalhão de Caçadores, em Aracaju, onde participou da formatura de novos soldados. O parlamentar elogiou a disciplina militar e destacou a importância das Forças Armadas na história do Brasil:
“Sempre tive admiração pelas Forças Armadas, especialmente pelo Exército Brasileiro. Foi uma alegria ver nossos jovens sergipanos ingressando nessa instituição que tanto contribuiu para a construção do nosso país”, disse.
Reconhecimento à Conferência Estadual de Promoção da Igualdade Racial
Em seguida, o deputado parabenizou a secretária de Estado da Inclusão Social, Érica Mitidieri, pela realização da Conferência Estadual de Promoção da Igualdade Racial, ocorrida na última semana.
“Foi um evento de grande importância para o fortalecimento das políticas públicas voltadas à população negra e à promoção da igualdade em Sergipe”, afirmou.
Crítica à fala do presidente Lula sobre imagem institucional
Grande parte do pronunciamento foi dedicada à repercussão de uma declaração feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o lançamento do programa “Brasil Sorridente”, em que teria criticado o uso da imagem de um homem negro e desdentado em material de divulgação internacional. Para Manuel Marcos, a fala foi infeliz e desrespeitosa com a população negra:
“Como homem negro, não posso aceitar uma comparação que associa a imagem do povo negro à exclusão e à falta de dignidade. O problema não está na cor da pele, mas no abandono histórico que muitos brasileiros sofreram, por não terem acesso à saúde, à educação de qualidade e às oportunidades básicas para uma vida digna”, afirmou o parlamentar.
Manuel Marcos destacou que declarações como essa reforçam estereótipos e ignoram a luta histórica da população afrodescendente, que teve papel fundamental na construção do país:
“A responsabilidade por essa realidade está em quem governou o Brasil ao longo dos séculos e não garantiu os direitos fundamentais à população negra. A imagem daquele homem não deveria ser tratada como um símbolo de vergonha, mas sim como um retrato do que precisa mudar com políticas públicas sérias, inclusivas e respeitosas”, completou.
O deputado também ressaltou sua própria trajetória como exemplo de superação, lembrando os ensinamentos de seus pais e o papel transformador do trabalho e da educação:
“Eu sou negro, filho de uma paneleira e de um soldado, e sempre aprendi que o que transforma a vida do ser humano é o estudo, o esforço e a dignidade. Não aceito que se use a imagem do povo negro de forma depreciativa, como se fosse sinônimo de inferioridade. Todos nós temos capacidade, inteligência e valor. O que falta é justiça social e reconhecimento da nossa história”, concluiu.
Aparte do deputado Luizão
Durante o pronunciamento, o deputado Luizão Donatrampi (União Brasil) solicitou um aparte para apoiar as palavras de Manuel Marcos e reforçou as críticas à fala do presidente Lula:
“Deputado Manuel, quero parabenizá-lo pela coragem e clareza em trazer esse tema à tribuna. A fala do presidente foi racista e desrespeitosa com a população negra. Infelizmente, tentaram justificar dizendo que se tratava do lançamento do programa ‘Brasil Sorridente’. Tudo bem, o programa é importante, mas o problema foi associar o ‘sorriso’ a um homem negro desdentado. Isso cria estigmas e reforça estereótipos que lutamos tanto para combater.”
O parlamentar destacou a necessidade de ver o ser humano além da aparência:
“Eu não consigo enxergar um ser humano pela cor da pele. Para mim, todos merecem respeito, independentemente da origem, da cor, da orientação sexual ou da condição social. Não vejo ninguém melhor ou pior do que ninguém. O amor que precisamos pregar é o amor que une, o que aproxima o negro do branco, o pobre do rico, o hétero do gay. Amor não é discurso de palanque, é prática de respeito.”
Em sua fala, Luizão também criticou a reação de setores políticos:
“O mais triste é o silêncio da esquerda diante dessa fala. Quando convém, gritam por igualdade, mas agora se calam. Ficam tentando justificar, dizer que foi mal interpretado, que foi tirado de contexto. Mas o presidente expôs o que pensa, e muitos vídeos antigos já mostravam esse tipo de comportamento. Quem julga o ser humano pela aparência ou condição é quem contribui para dividir a nação.”
Manuel Marcos agradeceu o aparte e solicitou que parte da fala do colega fosse registrada como parte de seu pronunciamento:
“Agradeço ao deputado Luizão pela contribuição e peço que suas palavras sejam anexadas ao meu discurso desta manhã.”
Aparte da deputada Linda
Por sua vez, a deputada Linda Brasil (Psol) também pediu a palavra e apresentou outra perspectiva sobre o episódio. Segundo ela, o trecho foi retirado de contexto e a fala do presidente teve como objetivo criticar a forma como o Brasil tem sido retratado no exterior.
“Deputado Manuel Marcos, eu não poderia deixar de me pronunciar neste momento. Tenho grande apreço pela sua história, que conheço desde os tempos em que trabalhamos juntos na Câmara Municipal. Sei que o senhor sempre foi um exemplo de superação, e compreendo a sua indignação como homem negro que lutou com dignidade por seu espaço na sociedade.”
A parlamentar, no entanto, ponderou sobre o contexto em que a fala do presidente foi proferida:
“Pelo que apurei junto à minha equipe, o presidente Lula fez essa declaração durante o lançamento do programa ‘Brasil Sorridente’, ao entregar 400 unidades odontológicas móveis. Na ocasião, ele criticou a escolha de uma imagem usada em uma cartilha do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que retratava um homem negro e desdentado como símbolo do Brasil para o público estrangeiro. O presidente não estava se referindo ao povo negro como um todo, mas questionando por que sempre se associa o Brasil a imagens de miséria, especialmente quando se trata da população negra.”
Linda Brasil defendeu que a fala foi retirada de contexto e usada politicamente:
“Infelizmente, vivemos um tempo em que falas são editadas, recortadas e utilizadas para alimentar narrativas polarizadas. Acredito que é fundamental ouvir os dois lados antes de tirar conclusões definitivas. O presidente Lula, como homem nordestino que passou fome, conhece bem a dor da exclusão. Jamais faria uma declaração para ofender ou diminuir o povo negro.”
A deputada ainda reforçou a importância das políticas afirmativas e ampliou a discussão sobre cotas:
“Concordo com o senhor quando diz que as cotas deveriam existir em todos os espaços. Elas devem chegar também ao Judiciário, ao Legislativo, aos altos cargos do Executivo. As universidades foram apenas o primeiro passo. Precisamos avançar na representatividade de negros, mulheres, indígenas, pessoas com deficiência e LGBTQIA+ em todas as esferas de poder. Só assim construiremos um Brasil verdadeiramente igualitário.”
Encerramento
Ao final de sua fala, Manuel Marcos agradeceu os apartes dos colegas e reforçou seu apelo pela união da população negra:
“Se unam, negros brasileiros. Vocês foram essenciais na construção deste país. Vamos continuar lutando por igualdade, respeito e dignidade para todos”, finalizou.
Fotos: Jadilson Simões / Agência de Notícias Alese
