Os primeiros frutos de cacau cultivados embaixo de coqueiros em Petrolina (PE) estão sendo colhidos a partir deste mês. O consórcio cococ-cacau teve início em 2022, com o plantio de 30 hectares na fazenda da PepsiCo, onde o coco verde é cultivado para a produção da água de coco da companhia no Brasil.
“No Vale do São Francisco, a produção de coco ainda não era desenvolvida em consórcio com outras culturas. Essa iniciativa é um esforço inédito de agricultura regenerativa”, ressalta Alexsandro Castro, gerente de Agroindústria na PepsiCo.
Segundo ele, o projeto-piloto que mistura as culturas de coco e cacau tem o intuito de promover ações de sustentabilidade, como a regeneração do solo. “O cacau aproveita a sombra dos coqueiros e as duas culturas se beneficiam da matéria orgânica da queda de suas folhas, além de ajudar na otimização dos insumos necessários como fertilizantes e água”, explica. A meta, com o passar dos anos, é potencializar as práticas de agricultura regenerativa e contribuir para a redução de emissões de gases de efeito estufa (GEEs).
O consórcio coco-cacau também visa ampliar a sustentabilidade econômica da cocoicultura na região, garantindo diversificação de atividades agrícolas e aumento na rentabilidade. “O cacau é uma commodity, então será inovador nesse sentido para os produtores, que poderão ter mais liberdade em suas operações”, acredita.
Castro comenta que, inicialmente, em torno de 30 pequenos produtores de coco parceiros da PepsiCo poderão levar o incremento produtivo do cacau para suas propriedades. A renda média de um produtor de coco na região – que é a principal região produtora do fruto em Pernambuco -, pode chegar a R$ 3 mil por hectare.
Em outubro, um evento será realizado na fazenda demonstrativa em Petrolina para apresentação oficial do consórcio aos produtores parceiros. Castro afirma que os interessados na iniciativa receberão doações de mudas de cacau para iniciar o projeto, assim como assistência técnica e orientações sobre o novo mercado. Além dos 30 hectares da área própria da empresa, o objetivo inicial é implantar o consórcio coco-cacau em outros 20 hectares em áreas de agricultores locais parceiros.
O produtor de coco Bruno Alves da Silva é um dos parceiros da empresa. Ele conta com uma área produtiva do fruto de 50 hectares, na propriedade localizada em Petrolândia (PE), município do Vale do São Francisco que acaba de assumir a liderança nacional na produção de coco, segundo dados da Produção Agrícola Municipal (PAM/IBGE). A produtividade média na área dele, segundo o agricultor, é de 400 frutos por planta.
Ele comenta que pretende entender melhor o funcionamento do consórcio para decidir se irá aderir à iniciativa. “O cacau traz segurança, por ser uma commodity é interessante para negociar. Mas, ainda é preciso ter mais informações sobre produtividade e rentabilidade de cada uma das culturas nesse arranjo”, avalia.
Primeiros resultados
Alexsandro Castro comenta que outras tentativas de unir as produções de coco e cacau foram feitas anteriormente na região. Porém, ele atribui a falta de sucesso à variedade utilizada, que não se adaptou ao clima. Após três anos de testes no projeto-piloto da PepsiCo, as variedades de cacau PS 1319 e CCN 51 foram as que melhor se adaptaram ao clima da região e à produção no modelo de consórcio. As duas variedades de cacau cultivadas oferecem rendimento, sabor e aromas diferentes.
Conforme o executivo, no fim do ciclo atual devem ser conhecidos os primeiros resultados da iniciativa. “Essas variedades responderam muito bem até o momento. Iremos medir os dados de produtividade e rendimento e avaliar qual delas melhor se adaptou ao espaçamento do coqueiro”, revela. E completa: “estamos iniciando esse desenho, o importante é que teremos cacau em uma região em que não se pensava em ter essa cultura tão cedo”. Ainda não há informações sobre o volume de cacau que será colhido.
Entre as apostas da empresa para a cultura está o desenvolvimento de subprodutos pelos agricultores, como o mel de cacau. A possível entrada na cadeia de produção de produtos à base de cacau da PepsiCo, como achocolatados, é considerada pela empresa futuramente. Para isso, a produção deverá alcançar níveis de qualidade e produtividade adequados para a indústria e os produtores deverão obter as certificações exigidas. Todos os produtores participantes já possuem certificações relacionadas à cocoicultura.
Benefícios
Humberto Rollemberg Fontes, pesquisador da Embrapa Tabuleiros Costeiros – onde a cultura do coqueiro é um dos principais focos de atuação -, destaca que o consórcio coco-cacau já existe no Sul da Bahia e em Alagoas, com resultados positivos.
“A importância desses sistemas integrados está em maximizar a eficiência do uso de recursos naturais como o solo e a água. É um exemplo de agricultura regenerativa em que se desenvolve mais de uma cultura em uma área com múltipla função, em vez de se ocupar áreas novas”, considera.
Fontes reforça que, nesse modelo de consórcio, o cacau se beneficia da sombra do coqueiro anão, que pode atingir 12 metros de altura. Além do cacau ser uma planta que gosta de vegetar em condições de sombreamento, o pesquisador explica que normalmente não há competição nutricional entre as culturas, uma vez que o sistema radicular do cacau é profundo e o do coco não.
A produção integrada de coco e cacau, conforme lembra Fontes, é consolidada na Índia e em países asiáticos, onde há sistemas múltiplos, incluindo ainda outras culturas no consórcio, como pimenta-do-reino e abacaxi. Mesmo que sem conhecer os resultados preliminares, ele prevê “ótimas perspectivas” para a iniciativa em Pernambuco e acredita que esse pode ser o pontapé inicial para que outras culturas possam ser adotadas, com base em quesitos como vocação da região e comportamento das plantas, exigência nutricional, altura de raiz, entre outros.
A Embrapa Tabuleiros Costeiros pesquisa há 12 anos o consórcio coco-gliricídia, planta leguminosa que é fonte de proteína para animais e resistente à seca, apontada como excelente opção para sistemas integrados. Em algumas regiões do Nordeste, até os primeiros quatro anos ou cinco anos da plantação de coco – feita em linhas, com espaçamento grande -, também é comum entre pequenos produtores o cultivo de culturas de subsistência, como mandioca, milho e feijão. O plantio é interrompido assim que o coqueiro comece a fazer sombra na lavoura.
Fonte: Globo Rural